dinsdag 16 december 2014

Mambo Jambo

Uma vez nesta época do natal eu quase ganhei na loteria. Em pé, ali no balcão daquela lotérica na Quintino Bocaiúva em frente àquela pracinha em Londrina, eu fui conferindo os jogos e acertando todos. Quando chegou no décimo segundo meu coracão parece que queria sair pela boca, acertei, o próximo tinha colocado um x na coluna do meio, Palmeiras contra Corinthians Paulista no Paecaembu. Apenas um empate me bastava, mas o coringão tinha que primeira vez ganhar de goleada, acho que foi 4x1!!
Voltei muito puto prá casa e tanta a raiva que nem comentei, amargurei sozinho mais uma decepcão em minha vida. Todavia, bola prá frente...
Aliás, pensando bem, sempre atrás vem gente, a vida esta repleta de "quases", "por poucos", "passou raspando" isso sem falar daquelas infinitas " bolas na trave".
Eu não sei o que mulher sonha, as coisas que passam dentro de suas cabecas, mas penso que todo menino um dia já sonhou em marcar seus gols de placa, fintar os obstáculos pela vida, driblar bonito todos os zagueiros pela frente, ver as redes balancando, assim como todo músico sonha em tocar seus solos e ser aplaudido.
Queremos sucesso, fortuna, alegrias, saúde, amor, aplausos, prosperidade, ninguém faz as coisas pensando em fracassar. Mas o fracasso temporário, as bolas na trave, os "quases" são outro lado da moeda, a cara, quando apostamos tudo no coroa. Um não existe sem o outro, assim como a escuridão não tem sentido algum sem a luz. Luz e escuridão são na verdade a mesma coisa.
Aprendi assim a buscar a luz pelos caminhos da vida, mas as escuridões não me assustam mais tanto quanto me assustavam tempos atrás. Talvez seja bobagem, porém confesso aqui que mesmo cinquentão, barrigudo e careca ainda sonho em marcar uns golacos de bicicleta pelos campos da vida, tocar uns solos maravilhosos no meu saxofone de deixar o mundo todo de boca aberta, mas se desafinar, atravessar o compasso, perder o fio da meada, bater na trave, passar raspando, tudo bem, o que vale é a intencão do momento, assim como deste que escrevo essas poucas linhas meio mambo jambas...



vrijdag 12 december 2014

Meio natalício

Talvez seja por causa do Natal que está chegando, não sei, mas eu já tinha quase me esquecido dele,  o  velho e surrado "gingle bells",  que apareceu de repente e deu de tocar o dia inteiro sem parar nos comerciais de tv. Se tem uma melodia que gruda na cabeca da gente é essa do " gingle bells".
Mas o espírito natalino até que é legal, a gente comeca a pensar nos parentes, na família, nos amigos, dar valor às coisas e pessoas que passaram quase despercebidas o ano inteiro.
Fico meio estonteado, quase pasmo, embora tente participar dessa modernidade toda ao alcance de minhas mãos, dos meus olhos, as fotos da Dilma, do Lula, os vídeos do youtube que todo mundo agora teima em postar no facebook,  pegadinhas,  labcriativo, milhões de bobagens, fatos e fotos  indo e vindo sem parar num turbilhão de idéias quase prontas que vão preenchendo, esvaziando, torcendo, repuxando, temperando e dando  quase em vão, seus sabores e dissabores à nossa sedentària existência cotidiana.
E agora o fim de ano se aproxima, Dio Mio. As postagens eleitorais vão diminuindo paulatinamente e dando lugar àquelas meio religiosas mais tradicionais. O velho barbudo (não o Lula) já pintou no pedaco, de roupa vermelha e sacos nas costas. Aqui na Holanda o Sinterklaas agitou bastante em dezembro e foi-se embora prá Espanha com seu barco.
Depois da euforia o povo fica sempre a ver navios. Porém, esse otimismo de fim de ano levanta um pouco no meu ver,  a energia, o astral deste nosso planeta de astral tão baixo ultimamente.
Não sei porque nessa época fico meio triste, melancólico, não é a falta dos que se foram, pois quando não tinham ido ainda era a mesma coisa, desde menino queria me esconder em algum canto, enquanto todo mundo festejava e soltava seus rojões assustando os pobres cachorros e gatos, e se atolavam de comida pesada, perus, castanhas, champanhe, eu gostava era de jejuar sozinho e pensar.
Confesso que só o cheiro de um bom panetone daqueles que a tia Mariquinha fazia lá em Londrina me traziam logo de volta de meus devaneios meditativos juvenis.
Saudades dela, tomar um cafezinho com pão francês quentinho que o Toniquinho ia buscar à pé lá no Fuganti, são  dessas coisas simples da memória da gente que não tem preco, dinheiro nenhum nesse mundo pode comprar...


woensdag 3 december 2014

Aos pés do Pessoa

Hoje uma mocinha holandesa, via facebook de um amigo, veio me pedir prá dar uma lida num poema do Pessoa e dar o meu parecer na traducão de uma palavra para o idioma holandês. Ela estava estava meio em dúvida, coitada, e isso eu bem que entendo, pois vivo também em dúvida, o Pessoa parece que era uma dúvida bem grande só, basta se dar ao trabalho de ler. Nessas coisas eu sou meio do contra, pois sou da opinião de que certas maravilhas deveriam jamais ser traduzidas. Quem quiser ler o Fernando Pessoa de verdade que vá beber a água da fonte, pô, dormir abracado com ele e com um bom dicionário da língua portuguesa. Todas as tentativas são vãs, infortúneas, é o mesmo que assistir um bom filme inglês ou francês traduzido em laboratório de estúdios da Globo no Brasil em português. Quem não comhece aquelas vozes sempre iguais, monotónas, imensamente chatas, geralmente com um leve sotaque meio carioca, com sons esquisitos lá no fundo, a macaneta de uma porta que gira depois que aporta se abriu, passos no escuro, diálogos bobos tentando imitar o original, as vozes dos galãs que não se sintonizam deveras com suas bocas. Os caras até que tentam, coitados, fazem de tudo, dão o melhor de si, mas sempre achei isso um crime muito grande. É melhor assistir uma boa novelinha de verdade.
Mas fui lá, li a tal poesia da mocinha e do Pessoa. Todavia, se tem alguém com o dom de escrever um universo todo no espaco de algumas entrelinhas foi esse homem, ele desliza pelo ar com seus coloridos, como que surfando nas ondas de um oceano literário somente dele, ignoto, hermetético, místico, quase às nossas mãos, porém  muitas vezes inacessíveis para sempre, pelo menos prá mim. Algumas coisas eu até que entendo, noutras fico boiando legal mesmo, mas gosto de deixá-las desentendidas, misteriosas, às vezes passo décadas sem ler nada dele, mas quando o leio um encantamento inacreditável repleto de magia assim de repente toma conta de mim. Esse homem era um mágico literário do nosso idioma pátrio. São caras como ele, como o Drumond, que me fazem orgulhoso de ter nascido brasileiro e falar quase a mesma língua.
Penso que certos mistérios deveríamos deixar do jeito que são, não por as mãos, apreciá-los apenas em sua plenitude. É a mesma coisa de tentar descrever o pôr do sol. Não existem palavras, por mais lindas que o sejam que lhe chegue sequer aos pés...




vrijdag 28 november 2014

Lembrando minha mãe

Hoje minha querida mãe estaria fazendo aniversário se estivesse aqui com a gente. Todavia, foi muito cedo, cedo demais como tantos outros amigos e familiares que poderiam ter ficado mais um tempinho aqui na Terra. A vida vai passando, os ventos vão soprando, o tempo vai correndo, o inverno vai chegando na Holanda. Os pardais vão e vem, bicando apressados as sementes de girassol que minha esposa pendurou no quintal. As hortências se apagam no jardim debaixo da janela, coitadas, só sobraram as flores descoloridas e quase secas, com o gramado sumindo por debaixo folhagem amarelada ontem caída e espalhada pelo chão. Resquícios dos pés de milho se debatendo ao vento gelado, sementes que cheio de esperanca fui distribuindo na primavera, assim meio ao acaso dentro dos vasos de flores da Sabine. Um jardim é ao mesmo tempo transitório e perene, se recolhe, adormece, quase morre de frio, prá de novo nascer meses depois quando o sol brilha mais forte. Talvez sejamos todos jardins, somos sementes de milho, raízes superficiais e fasciculadas, fazendo de tudo prá se firmar neste sagrado chão. Não é qualquer ventinho que nos balanca as folhas, às vezes caímos mas temos os caules duros e ao mesmo tempo flexíveis, parênquimas teimosos, não é qualquer seca que nos faz desistir. Que esfrie, que vente, que chova demais, enxurradas torrenciais  não nos lavam a alma, somos monocotiledôneos, gramíneos, perfilhamos e seguimos em frente cada um com sua cruz, cada um com sua missão...
Porém sofremos, choramos, enterramos nossos mortos, que continuam todavia vivendo prá sempre dentro de nossos coracões, assim como a dona Tereza, que prá mim está fazendo mais um ano de vida, pois a vida não passa, não morre, adormece, perfilha e se transforma...

dinsdag 25 november 2014

Se a gente falasse a verdade no facebook

Até que seria legal poder falar a verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade nos facebooks da vida. Ao invés de clicar em cima, sem sequer se dar ao trabalho de ler,  aquele tradicional "eu gosto", sair prá tudo que é canto que nem um louco clicando "eu detesto", " eu acho uma bosta", "de novo isso!", " vá te catar!",  até inventar um clique "cara chato, pentelho" para diferenciar uns e outros  que pegam pesado demais, e passam o dia,  acho que sem fazer nada, todavia, impunemente por detrás de seus respectivos laptops copiando e colando sem parar parar, mensagens à torto e à direita na tela da gente.
Fico imaginando as conversas e cada frase, " lindíssima, arrebentou!" (puta, como ela tá gorda, parece uma baleia!!). "Que charme" (Tadinha, ô mulher feia, essa só sobrou o bagaco!). "Que lindo o teu apartamento novo!" (Vá ter mal gosto assim lá na casa do cacete, meu!). "Puxa, que delícia de bolo, me passa a receita, viu?!" (Essa aí agora pensa que é cozinheira, isso não tem cara de bolo, nem cresceu, parece uma pizza, deve ser duro e ruim de um tanto...). "Que foto mais liiinda!" (Com fotoshop até eu). "Legal, curti, demais esse vídeo!" (Detesto música sertaneja). "Parabéns, manda prá mim que vou ler o teu livro!" (Ai meu saco, como esse cara tem o papo compriiiiido, e só escreve do passado e de gente que já morreu). "Prima, que gostoso ver a família assim unida!" (Unida uma ova, viviam era se pegando). "Poxa, não sabia que a Holanda era tão linda assim!" (Tão linda assim e tão fria, eu hein, tô fora, frio de matar!). "Curti, que bicicleta legal!" (Pô, vai saber lá porque esse cara agora deu de postar fotos de bicicletas velhas?). "Como a dona Hermelinda está bem, meu Deus, tá igualzinha, não mudou nadinha, que saudades dela! (Ué, não morreu ainda? ô véia mais chata, quando eu era pequeno me dava vassourada, xingava a gente, furava as minhas bolas quando caiam no quintal dela, rabugenta e ainda por cima era fedida, como fediiia aquela velha, tá parecendo uma múmia...)
Eu sei que não pode, que isso jamais vai acontecer na prática, só na cabeca da gente,  mas seria legal se a gente falasse um pouquinho da verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade...

maandag 24 november 2014

Sonhos Atalaícos

Como é bom sonhar! Sem os sonhos da gente a vida talvez não passe de uma realidade das muito chatas. Eu sempre gostei de sonhar, principalmente acordado, ficar em vão imaginando as coisas mais inverossímeis deste mundo acontecendo ao meu redor e dentro de minha cabeca.Infelizmente,muitas vezes o sonho é como uma "nuvem passageira que com o vento se vai, e eu sou como um cristal bonito que se quebra quando cai..." Quem se lembra daquela música? Eu quando menino adorava ouvir e cantar, pois diariamente tocava na rádio Atalaia de Londrina, e eu ficava me imaginando assim todo molhado me dissolvendo como um castelo de areia na beira de um mar, que todavia ainda nem conhecia de verdade, só de fotos e das cenas quentes das novelas da globo de então, a Sônia Braga de biquini, beijando o Antônio Fagundes, que quisera fosse eu. Ah, ah, depois alguem escrevia meu nome numa pedra, mas eu já sabia, desde aqueles tempos ancestrais,  que essa pedra em pó iria se transformar. Era uma pedrona dessas bem grandes, um pedregulhão dentro do sapato da gente, no meu próprio caminho, mas pensando bem era de uma grande poesia singular aquela letra, e a melodia tinha um balanco contagiante, assim como a vida da gente também nos balanca e contagia, e às vezes nos carrega bem pra longe em nossas tempestades. Porém os ventos do tempo que nunca param os nossos moinhos...Eu cá comigo, não posso fazer nada, por algum descuido do destino nasci assim sonhador, e sonhar é o que sei fazer de melhor. Sonhar e acreditar na vida, no amor, na paz, na harmonia, na evolucão do ser humano, na elevacão de nossas almas aos planos mais altos, enfim, na esperanca de um futuro muito mais que melhor para este mundo...

woensdag 19 november 2014

Ausências e beijos

A minha esposa um belo dia resolveu recortar todas as minhas fotos antigas da perdida juventude de outrora, onde o velho Migué, naquele tempo ainda jovem, fogoso e cheio de orgulho, fazia alguma daquelas poses assim meio sem jeito lado de alguma namorada com um pouco mais jeito que ele. Hoje fui arrumar minhas gavetas e num assombro vislumbrei aquelas relíquias infelizmente prematuramente decaptadas com uma tesoura meio cega daquele lindo dia para todo o sempre.  Lembro dela, minha esposa, sentada na varanda do Mirtão num domingo ensolarado, minha filha pequenininha do lado, com a respectiva tesourinha dela nas mãozinhas, ambas curtindo excitadas da sua própria maneira. Eu tomava uma gelada e estava tão exausto das enxadadas que tinha dado lá na terra roxa daquela chácara, quem nem me importei, ainda falei corta sim, pode cortar pois isso tudo é passado, águas que não movem mais moinhos. Todavia, me deu um friozinho na barriga quando ela decaptou a Giselinha, com uma tesourada bem no meio do pescoco, ficou no chão recém enceirado da varanda aquele vestidinho estampado dela, um pedaco dos ombros à mostra, e resquícios daqueles lábios de mel, retocados com baton sabor de morango que um dia beijara com tanto fervor. A Mônica foi pro lixo com roupa e tudo, a Jaqueline sumiu prá sempre de uma vez,  aquela moreninha escriturária do Banespa, coitada tão linda, saiu definitivamente de minha vida numa recortada só. O Mirtão se levantou prá ir até o freezer buscar mais cerveja ou dar uma mijada, a tarde foi se ausentando de leve em Londrina, com os Bem-te-vis lá no alto dos postes em seus ninhos improvisados, entre o concreto e os fios de eletricidade, anunciamdo que iria chover. A minha juventude também foi se ausentando aos poucos de mim, ficaram os abracos quase esquecidos, mãos dadas com um buraco vazio, beijos na pura ausência...

zondag 16 november 2014

Ode a um poeta desconhecido

Poeta desconhecido,
Versos esquecidos
Nas páginas de um
Caderno qualquer,

As palavras escritas,
Porém, nunca lidas,
Momentos, mágoas,
Teu viver, teu rimar,

Poeta desconhecido,
Sonetos entristecidos
Rabiscos, versos num
Caderno qualquer,

As lágrimas escritas,
Porém nunca lidas,
Pensamentos, águas,
De teu solitário mar,

Vens navegar comigo,
Por oceanos sem fim,
Entre os dois mundos
Fora e dentro de mim...

Cochilos galísticos

O meu velho amigo Hans veio ontem me visitar, está aposentadão e mora perto de Limoges na Franca já há vários anos. Grande lateral direito, uma locomotiva diesel nos campos de futebol enlameados e cheios de neve das várzeas holandesas. O Hans é uma dessas pessoas que tem o dom de fazer a gente rir, à mim pelo menos. Tempos atrás teve um ataque cardíaco, coitado, bem no meio de umas de suas escapadas atrás de algum ponteiro esquerdo. Desmaiou ali mesmo, e por sorte paasava alguém que tinha feito um desses cursos de primeiros socorros e o reanimou até a ambulância chegar. O Hans quase morreu e o cirurgião que o desentupiu as veias disse que foi um milagre.
E milagres acontecem, eu acredito neles, pois é um milagre estar vivo aqui, escrevendo essas bobagens que escrevo, pensando essas bobagens que penso.
A esposa exagerada foi quatro vezes ao supermercado e voltou com sacoladas  e mais sacoladas de frutas,  as quais magnificamente colocou em exposicão em uma bandeja bem no meio da sala. O Hans acho que nem notou. Chovia muito, sentamos no sofazão, abrimos as garrafas de vinho tinto e relembramos nossas glórias passadas correndo atrás das pelotas. Futebol sempre foi prá mim. Uma paixão, porém para o Hans acho qu é muito mais, um culto ecumênico, uma forma de religião.
Sempre foi assim, infelizmente vai chegando nove horas da noite e vai me dando sono, comeco a bocejar, respirar fundo, vacilar, perder os fios da meada.
Hans reclamou que as galinhas do seu quintal não botavam mais, até xingou feio em holandês as coitadas das aves. Perguntei se era o mesmo galo que tinha, aquele gordão carijó, que prá mim tinha cara de bicha, ô galo cheio de trejeitos, como diria o Mirtão esse galo foi, é, ou um dia vai ser!
Papo vai, papo vem, minha mulher se gabou que eu sabia tudo sobre galos de briga, que os houvera criado em minha juventude lá nos tempos de Londrina. Pronto, a esposa do Hans é uma dessas francesas que não se contentam com explicacões simplificadas, e tive que inventarizar os pormenores de minhas experiências galísticas avícolas.
Ganhara emprestado um galo de um vizinho muito rico que morava do lado da frente de casa. Como tínhamos um terreno muito grande e vazio, com apenas algumas galinhas caipiras ciscando
tranqüilas, seu João me emprestou seu galo índio campeão de mais de 21 lutas nas rinhas proibidas
do interior de São Paulo e Paraná. Nunca vi galo mais lindo e orgulhoso como aquele. Entrou no novo terreiro como um conquistador, abanando as asas vermelhas enormes e  cheio de si mesmo cantando forte e afinado, um canto que dava prá ouvir quarteirões de distãncia, apavorando de medo todos os outros galos concorrentes da vizinhanca.
As nossas galinhas caipiras e as branquelas de granja parece até que faziam fila, ciscavam excitadas em volta dele como que a espera de algum convite para uma grande farra, uma grande orgia. O galão galã passeava altaneiro pelo palco daquele meu teatro insólito, eles nem se davam conta de mim, eram os atores principais, aquele menino pobre e sonhador era apenas mais um expectador...
Notei que o papo desinteressava Hans, mas a francesa queria saber mais, os pormenores das lutas, das rinhas, dos rebolos. Que idade que eu tinha, como treinava meus galos, o que acontecia com os que perdiam as lutas. Sabe, gosto de escrever, mas não de falar muito de minha vida para os outros, ainda mais se for em outra língua, holandês por exemplo. Busquei na memória descolorida as cores e
nuancas de meus galos índios, a tessitura caleidoscópica de seda de suas penas das costas, a
musculatura rígida e firme daqueles atletas do meu passado. No fim foi gostoso lembrar disso, acho
que a moca ficou boqueaberta com todo aquele súbito conhecimento galístico. Notei que o velho
Hans cochilava um pouco. Eu também queria fechar os olhos e me esquecer de tudo, dormir trezentas horas talvez. Porém as noites foram feitas para serem curtas demais, talvez assim como a vida da gente, que vai passando como um vôo, tal qual meus galos índios  e os cochilos do Hans...








vrijdag 14 november 2014

Saindo do Armário e bobagens fitológicas

Literalmente falando saí do armário. Não consigo mais me esconder atrás de pseudônimos outrora inventados. Relatar, escrever sempre fez parte de minha vida, todavia, pouquíssima gente teve o prazer ou desprazer de me ler. É algo assim como ir desamarrando nós quase cegos que se embaralham nessas curvas de rio por debaixo desta cinquentenária careca brilhante. Uma ou duas pessoas me enxergaram de verdade por entre as milhares e milhares de outras almas quase literárias quanto a minha. Uma delas foi uma portuguesa professora de botânica na universidade. Devia ter uns sessenta e tantos, era magrinha, quase sumia, mas sempre bem cuidada, de unhas feitas, maquiagem, elegante e ao mesmo tempo brava como ela só. Botânica me interessava muito, mas futebol mais ainda, basquete, música, poesia, sem falar nas meninas bronzeadas de biquini nas piscinas da vida.
Pensando bem, confesso aqui, fui um desses camaradas que passou pelas escolas esperando pelo sinal.
A prova era sobre fotossíntese e absorcão radicular ou qualquer coisa do gênero. Eu havia lido os xerox emprestados rapidamente no ônibus, do Castelo Branco ao campus universitário. O anfiteatro era imenso, lotadíssimo, umas cem pessoas, aquelas cadeiras geladas que doem a bunda da gente, e feitas apenas para destros. Os canhotos que se virem, que se entortem todos, já são tortos mesmo. Fazia um calor infernal, o ventilador um barulhão daqueles. Eu estava apaixonado por uma japonesinha da fisioterapia, a Aniko, que menina meiga, e marcara um encontro na lanchonete. Fui o primeirão a terminar e sair correndo da prova. Entreguei meus rabiscos à portuguesa e corri rumo à porta. Não deu tempo de chegar nem na metade do corredor e ela gritou lá debaixo, abanando o meu teste como se fosse um leque, "miguelangelo, fizeste uma prova miserávelll!" Todo mundo rachou a rir, tem gente que até hoje quando encontro na rua ainda parafraseia a velha portuguesa com seu sotaque engracado. Fiquei encabulado, estava quase lá fora quando ela completou " muito bem sei que não sabes nadinha, mas tenho que te dar um 5,5 pois escreves tão bem!"
Passei pelas botânicas da vida, a velha portuguesa com certeza já deve ter até morrido, que Deus
a tenha, coitada, gostava de ler as bobagens fitológicas que eu escrevia, não sei porque fui me lembrar disso agora...


maandag 20 oktober 2014

Ausências

Dėcadas um tanto ausente,
 Fechando as portas deste
Passado quase dormente e
Mil perigos muros abrigos
Águas correntes que nunca
 Voltam, meus pensamentos...

 Girando em círculos passam
Os dias tal qual silêncios
 Janelas tristes da fantasia
 Entre ruídos que não existem
Senão os ventos de um oceano
 Que nunca acalma dentro de mim...

 Prefiro as partes quisera o todo,
 Semblante ensaios vagos sentidos
Ondas as mágoas cores paisagens
 Miragens flores que de passagem
Carrego em dores pelas viagens
Da alma aflita a buscar sem fim...

vrijdag 19 september 2014

Patinadas Inesqueciveis

Parece que estou ficando pior que o Toniquinho, meu querido falecido tio Tonico, louco pra embaralhar as coisas e trocar as bolas que nem ele so. Pois cada vez que dou uma patinada, como dizia o Mirtao, eu me pego lembrando das deles. Como nao tenho com quem conversar em portugues por aqui, passo a vida conversando comigo mesmo. Agora a pouco fui sentar no meu cantinho preferido do sofa e um dos moleques deixou uma manchona gigante de espaguete ou outro molho qualquer. lembro que minha mae jogava sal pra tirar manchas, tambem joguei, passei um pano com sabao e vi a coisa piorando, a mancha vermelha se expandindo e misturando com as fibras verdes da esponja de cozinha. Soltei um ditado toniquinhesco: "ficou pior a emenda que o peixe!?" Acho que agora que estou ficando velho vou ter que rir de minhas proprias patinadas, todavia as dele ate hoje me dao uma baita saudade daqueles bons tempos em Londrina. Uma vez paramos ali naquela padaria da Avenida Tiradentes do lado do Marista, estacionou a velha Vemaguete vermelha de capota desbotada e cochinil meio amarelo querendo ir pro rosa. Chovia um pouco, e de sombrinha respingando e molhando todo o chao entramos na padaria. Pensando bem acho ate que ja escrevi isto em algum outro texo mais antigo, mas nao interessa. O velho pediu dez paenzinhos, duzentos e cinquenta gramas de presunto e duzentos e cinquenta gramas de mossarela. A mocinha polidamente informou que o presunto infelizmente acabara. Toniquinho sorriu, "Ah nao tem presunto, que pena, entao me da duzntos e cinquenta gramas de mossarela e duzentos e cinquenta de presunto". Eu estava ali do lado, talvez esperando a mocinha se abaixar pra enxergar melhor os peitos dela. Porem fiquei quieto, ela mais uma vez explicou com voz mais alta, pois achava que o velho nao a escutara direito, "o presunto acabara, senhor, so tinha mossarela ou mortadela". Se desculpando o velhinho bateu a mao no bonezinho xadrez que a Telma, minha irma mais velha tinha trazido pra ele dos EUA, "A que cabeca a minha, nao tem presunto nao, entao me da dez paenzinhos, duzentos e cinquenta gramas de mossarela e duzentos e cinquenta gramas de presunto!" Ate o dono da padaria chegou mais perto pra acudir, entretanto ninguem se conteve, nem a mocinha e nem eu mesmo, caimos na gargalhada em unissono, Toniquinho naquela tarde que nao volta nunca mais riu gostoso de suas proprias patinadas inesqueciveis!

donderdag 4 september 2014

Os Livros do Ze

E o tempo vai passando...Como passatempo estou tentando ler um livro chamado Brazilie, escrito por um tal de Ubaldo. Eu contei as paginas, sao 714 e tudo em holandes. O Ubaldo ate que escreve bem, sao paginas sem fim passando, todavia confesso que perco um pouco o fio da meada aqui e ali. Mas nao e culpa do Ubaldo apenas minha, eu e meu holandes que por sinal e muito pior que meu portugues, como se isso fosse possivel... A coisa complicou quando ele falou do Reconcavo dele, acredito que seja o baiano, mas ainda nao tenho certeza, confesso aqui que pulei umas paginas, quis ir la no fim mas nao fui... Lembrei com saudades do Ze Galinha, um amigo que eu tinha e que vivia comprando livros complicadissimos. Uma vez fui morar uns tempos na republica dele. O Ze tinha mania de colecionar tenis de marca e namoradas. Os tenis brancos ficavam enfileirados no canto do quarto, debaixo da janela, um monte de vidrinhos de perfume e na prateleira inumeros livros e dicionarios da lingua portuguesa, inglesa, francesa, pensando bem ate holandesa. Na epoca o Humberto Eco era o tal, e era o de cabeceira do bom Jose. As visitas e principalmente as futuras namoradas ficavam impressionadas com erudicao do meu amigo Ze. Um dia estava sem fazer nada e resolvi folhear uns exemplares daquela biblioteca maravilhosa ali aos meus pes. Abri o Cem Anos de Solidao, com uma orelha numa pagina quase no finalzinho. O Ze falou orgulhoso, esse e do cacete! Notei que algumas paginas estavam ainda grudadas umas nas outras, mas fiquei quieto, quando fui folhear um grossao acho que era do Joao Cabral de Mello Neto, notei que estava imaculado, novinho, com paginas tambem virgens, todavia uma orelhona bem no meio. Fiquei meio cabreiro, perguntei ao Ze se lia de verdade aquelas obras literarias maravilhosas, ele quis desconversar, disse que estava com pressa, tinha que sei la ir ao Banco que estava quase fachando. Como nao tinha nada pra fazer fui junto na garupa da moto. No final da tarde, depois de tomar umas geladas ele se abriu pra mim, disse que visitava as livrarias e perguntava as balconistas, qual era o melhor, mais vendido, mais grossao, com capa bonita, comprava logo uns dois ou tres, lia o titulo, prologo e fim, deixava marcado no meio pra dar moral, mas esperto como era sabia o nome dos personagens eum pouco da trama. A gente era amigo de verdade, gostava do Ze, tambem confessei que gostava de escrever mas nao de ler, coisa paradoxal minha, todavia... Ele tambem confessou que o unico de verdade que leu na vida foi o Olhai os Lirios do Campo, eu tambem tinha lido na escola, so que pulei um monte de paginas! A minha vida e assim como os livros do Ze, as vezes so sei o nome dos personagens, outras o comeco, fica faltando o fim, as vezes um fim sem comeco, assim como esta saudades do meu Brasil... Voltei ao Reconcavo do Ubaldo, onde andara o Ze Galinha por esses dias. So lembro o apelido dele, pena que nao da pra procurar no Facebook por apelido. A cachorrinha da vizinha comecou a latir, coitada, esta la sozinha no quintal choramingando. Se chama Angel e segundo a vizinha e ADHD, ou seja muito louca. Orelhei o Ubaldo e sai pro quintal pra consolar a Angel. "Como vai essa menina linda!!! com um tom de voz meio agudo que so uso quando falo com bebes ou cachorrinhos. Ouvi a coitada dar um latido alegre la do outro lado do muro, queria brincar com ela, afagar-lhe as orelhas macias. Ambos empolgados, ela latindo, eu gritei mais alto " como vai essa menina linda?" No mesmo instante a velha gorda vizinha do outro lado saiu com a bicicleta dela pelo portao do fundo. Tem que se espremer toda pra poder passar pela brecha apertada. Por coincidencia ela acabara de voltar de ferias da Dinamarca, onde o filho gay mora com o namorado. Pelo tamanho do sorriso e a piscada de olhos com certeza pensa que a dos meus olhos e ela. Inusitado momento, coisas que parecem que so acontecem comigo. Acho que vou voltar pro Ubaldo, mas so de sacanagem acho que vou pular mais de setecentas em homenagem ao meu amigo Ze e cair sozinho no Brazilie la no finalzinho...

donderdag 17 juli 2014

Copas do mundo do passado e presente

Fiquei vermelho de vergonha, confesso que quase chorei. Minutos antes do jogo contra a Alemanha meus filhos tiraram uma foto minha deitadao no sofa embrulhado na bandeira verde e amarela servindo de cobertor. Deixei me levar pelo velho orgulho patrio que como a cansada esperanca e o ultimo que vai morrer, e num subito momento de alegria virtual colei no meu perfil do facebook, com uma vontade imensa de estar ai junto de meus irmaos, amigos do passado, enfim de todo esse povo brasileiro maravilhoso do qual numca me esqueci. Nao sei porque isso sempre acontece comigo, sempre que fico empolgado com alguma coisa e me deixo levar nas ondas tsunamicas deste orgulho levo na cabeca. Num passou dois minutos e levamos o primeiro gol. Ate ai tudo bem, pois quem ri por ultimo ri melhor, traduzi do holandes para o bom idioma que meus filhos pouco entendem. Na mesma semana, levado tambem pela onda da copa, infinitas imagem de Fortaleza, Copacaba, do Cristo, muito samba e gente feliz, coisas que passavam diariamente nos jornais, resolvi ensinar algumas palavras a eles. Por onde passo pela cozinha, corredor, sala, ate no banheiro vou colando desses papeizinhos amarelos de deixar mensagem com frases em portugues, palavras soltas, ditados, etc. Fiz isso pra melhorar o vocabulario minusculo que andaram pegando de ouvido, aqui e ali, sem estudar as partituras. Nao sei se e coisa de moleque mas so falam besteirol, ainda por cima errado e com sotaque muito forte. Mas tudo bem, aprenderam o que e espelho, escada, toalha, panela, torneira, papel higienico, emfim coisas importantes e do quotidiano da gente. No segundo gol comecei a ficar emio cabreiro, os sms no celular deles comecaram a chover sem parar, amigos e amigas tirando um sarro em cima. Depois do terceiro gol, com os David Luis ja quase chorando no meio da zaga, o Filipao meio barrigudo como um espantalho do lado do campo, as imagens das mocinhas todas pintadas de verde e amarelo chorando, todo mundo de boca aberta, a cara de filho da puta do Muller, foi me dando um no no peito, e aquela certeza triste que nao teria mais jeito e seria de goleada. Quando terminou o primeiro tempo corri pro computador e abri o facebook para tirar a tal foto de mim mesmo com cara de bobo, mas infelizmente era tarde demais, os comentarios chegavam sem parar, havia sido compartilhado pela familia e amigos, cortado e colado em outras paginas, compartilhado assim meu orgulho carente e minha tristeza ambundante e dormente... Aqui do outro lado do mundo ja era quase meia-noite, depois do quinto gol mal torcedor que sempre fui, deixei o navio em chamas naufragando no meio do oceano e fui dormir chateado. Um de meus filhos, um pouco por pena de mim ainda me deu um "boa noito"...

maandag 2 juni 2014

A ave do vizinho

"Nao acredito que voce fez isso!", foi o que me disse quando ouviu aquilo. Confesso aqui, fiz sim, isto, aquilo e tantas outras coisas pensando bem pouco louvaveis. Ninguem se lembra mais disso, acho que nem o Mirtao. Um dia apareceu de repente la no fundo do quintal do vizinho uma ave esquisita, enorme e diferente. Tinha as pernas compridas e sem penas, com um pescocao imenso meio verde-amarronzado. Em minha fantasia de menino aquilo era um bicho pre-historico, qualquer coisa vinda do Jurassico de nossos ancestrais. O velho estilingue de tripa de mico balancava no meu pescoco e aquele jubilo de excitacao de cacador tomou conta de mim. Iria derruba-lo com uma estilingada de coquinho verde, que preferia usar ao inves de pedras, que me pareciam muito crueis e dolorosas. Eu me escondi atras de uma moita de cana caiana e mirei bem na cabecona do passaro. Eu me sentia um proprio indio xingu ou tupi-guarani, descalco, sem camisa com meu self-made estilingue carregado em minhas maos. Soltei as borrachas esticadas de minha arma improvisada e a bala-coquinho saiu zunindo e rodopiando em linha reta no ar. A ave se moveu e a coquinhada foi pegar bem na asa da coitada, que correu pelo terreiro taxiando por aquele aeroporto de terra e vegetacao do seu Nene, vizinho do lado. Chegou a subir quase um metro do chao, mas parecia um boeing carregadissimo e por alguma lei da aerodinamica ou talvez pela coquinhada infelizmente nao saiu do chao. Tentei outra vez, todavia sem sucesso. O mirtao apareceu no quintal, fumava um minister escondido, aparentemente surrupiado do bolso da camisa do meu pai. Ele se juntou a minha tribo e os dois em bando acurralavam a ave assustada, que corria, pulava, dava viravolta, mas os muros e cerca do quintal a deixavam a nossa merce naquela prisao. Apos alguns minutos daquele pega-pega chefe Mirtao desistiu da empreitada. Tinha outras coisas melhores pra fazer do que correr pelo quintal atras de passarinho. Naquele tempo me lembro bem ele corria atras das mocinhas empregadas domesticas da regiao. A contragosto fiquei sozinho estilingando e felizmente para o passaro errando. Isso quando seu Nene voltou do trabalho e correu acudir seu filhote de Ema que pobrezinha tinha perdido a mae atropelada (penso que pelo proprio Nene, que Deus os tenha). Pedi minhas sinceras desculpas a ele e a Eminha, que ficou passeando pelos quintais agora protegida por mim, ate criar coragem ou aprender a voar. Depois um dia voou bem alto e de cima do pe de tamarindo ainda me deu uma olhadinha, soltou um canto, que mais parecia um ruido de um trem apitando e querendo partir, depois foi embora pelo mundo, viver novas aventuras...

vrijdag 23 mei 2014

Saudades do Nerso

O velho Nerso gostava de fazer palhacada, mas na verdade era um cara letrado, gostava de politica, lia demais. Aposentadao, penso que tinha tempo de sobra. Um dia me deu um livro de contos do Guimaraes Rosa pra ler, Sagarana, adolescente confesso que achei o Guimaraes meio prolixo, pra nao dizer chato, mas depois entrei na dele e fui ate o fim. Era um livrao grosso de capa meio verde, mais grossao ainda que o Neruda de minha irma, que eu lia em espanhol saboreando as frases que todavia so entendia a medade infelizmente. O Nerso vinha varias vezes por ano passar as ferias com a familia e quando minha mae dizia que ele ia aparecer eu ficava de butuca esperando com ansiedade, pois adorava ouvir ficar perto dele, ouvindo as estorias, contos, causos que ele contava como ninguem, com um vozeirao de locutor de radio e uma imaginacao sem limites. O Nerso pensando bem era o meu Gabriel Garcia Marques e um dia ate pensei em gravar tudo que ele contava, mas como nao tinha gravador e tudo mais acontecia muito rapido em minha vida e ao meu redor, foi ficando por isso mesmo, como tantas outras coisas em minha vida. Minha mae dizia que minha vo sofreu muito com ele quando moleque e cada circo que passava pelo vilarejo o Nerso se ajuntava com eles, ajudava a cuidar dos bichos, armar o picadeiro. Quando o circo ia embora ele largava tudo e ia junto, vovo tinha que ir buscar no proximo vilarejo. Gostava de palhacos e tinha aquele dom natural de fazer a gente rir, nao importa a piada ou causo que contasse. Estava de regime, nao podia comer acucar com a diabetes dele, e a esposa alema lhe controlava na cozinha. Quando ela dava as costas ele batia continencia e colocava os tres dedos no ombro como se fosse as divisas de um sargento imaginario. Era so a coitada entrar no banho e ele piscava pra mim e eu ficava de sentinela na porta da sala, Nerso se atracava nos frutos proibidos da geladeira, pao feito em casa, mortadela, queijo, o que encontrasse pela frente, enchia a boca e depois engolia tudo com goladas de cafe preto caprichado com colheres de acucar. Eu e um outro primo meu eramos cumplices e ao mesmo tempo atores e plateia naquele teatro improvisado. Ah, que saudades dele, daqueles bons tempos de nossas vidas. Eu gostava de ouvir a estoria do ricardao ou joaquinzao do guaranas bem bom, personagem de sua infancia e que ele ia contando e ao mesmo tempo imitando. O gordao parece que tinha uma formula secreta do guarana dele que guardava a sete chaves e era tao gostoso que a propria coca cola queria roubar. Quando ele repetia a estoria do aviao em Marilia que entrou numa tempestade feroz e os passageiros ja estavam rezando e se despedindo deste mundo o piloto achou um buraquinho do tamanho de um pires naquele nevoeiro e mergulhou o nariz da aeronave chacoalhando pra todo lado ate finalmente estancar em cima de um cafezal em flor. Ninguem se machucou, Nerso aplaudiu o piloto que chorava em silencio. Dentro de mim eu tambem aplaudia, hoje choro em silencio quando me pego lembrando daquele velho palhaco maluco. Saudades do meu tio Nerso, de minha juventude no norte do meu Parana...

dinsdag 20 mei 2014

Passatempo

Foi no balneario de Camboriu que o grande e saudoso Nerso meu tio um dia saiu com isso ou seja, inverter a ordem dos ditados populares de entao. Chovia sem parar, deixando as ruas de paralelepipedos cobertas numa enxurrada diluvial ate entao nunca presenciada por mim menino. Entupiram-se todas as bocas de lobo das calcadas com restos de lixo, pedacos de pau, folhas, enfim tudo boiava a nossa frente naquele domingo inesquecivel de ditos populares nunca dantes embaralhados. 'De pouco e de louco todo mundo temos um medico' ainda meio encabulado arrisquei um meu, Nerso gostou, tirou os olhos do livrinho de palavras cruzadas e me deu um sorriso. Ele e minha mae eram loucos por palavras cruzadas e os melhores que ja encontrei no meu idioma patrio. Era um dos mais dificeis, daqueles que a gente comeca, rabisca aqui e ali, busca ajuda de cabeca pra baixo, depois enche o saco e acaba em qualquer canto da sala ate vir alguem resolve-lo. 'Agua dura em pedra fura tanto bate ate que mole' minha irma adicionou na lista, que alguem escrevia num pedaco de papel de embrulhar pao. Ja estavamos chegando quase nos cem, e so os melhores passavam pelo controle de qualidade do velho Nerso. Pensando alto ele falou com seus botoes, 'Deusa grega da beleza, com oito letras?. Estava na ponta da lingua mas nao achava. O Mirtao passou pela geladeira, abriu uma latinha de cerveja e veio ao socorro, 'nao seria Afrodite, por acaso?' Nerso conferiu com as horizontais e batia. Grande Mirtao, obrigado. A chuva continuava a cair, uma cobra verde passou surfando com a cabecinha de fora na correnteza, coitada alguem caiu de pau em cima dela. Assustada e quase afogada sumiu por detras de umas moitas de taroba. O sol nao aparecia, la longe dava pra ver as ondas encrespadas enormes quebrando em frente aos predios. Uns argentinos passaram de barco de borracha pela rua deserta e pararam em frente a padaria. 'Papita, mamita' imitou-os o Nerso, que se enroscava em mais uma curva de seu passatempo predileto. Esta era dificil demais, 'rio europeu que atravessa o maior numero de paises?' E da-lhe todo mundo em volta dele a queimar os respectivos neuronios. Dona Tereza estava certa que era o Volga, mas nao cabia. Ficamos la um tempao olhando a chuva e pensando. O Mirtao passou com mais uma latinha e deu o seu palpite 'cabe o Danubio?'. Na mosca, o Nerso agora o aplaudia e fazia reverencias, 'Poxa, eu nao sabia que o Mirto tinha um conhecimento tao grande e variado assim, gente!'. Eu queria que aquele tempo parasse ali, na felicidade simples daquela tarde de domingo entre os meus familiares mais queridos. Chegamos ao centesimo ditado trocado 'Em terra de rei quem tem olho e cego'. Mirtao fechou com chave de ouro mais umas duas paginas do quebra-cabecas do Nerso. No finalzinho da tarde o sol apareceu, uma loirinha de biquini filha do padeiro arriscou a ir ate a praia. Eu fui seguindo-a apenas com os olhos. Mirtao foi tirar uma soneca, depois desceu com uma revistinha de quebra-cabecas embrulhada que tinha todas as solucoes para os problemas do Nerso. Na falta de couve mamae refogava as folhas da taroba com alho e cebola, cheiro e sabor de minha infancia que nunca mais lembrei, ate agora neste exato momento, que embora escrevo vou deixando tambem passar...

zaterdag 3 mei 2014

As magoas nao passam

Aconteceu, tudo passou, aos poucos foi ficando triste, momentos vividos apenas, de repente essa dor na gente, momentos eu quisera quardar no freezer do tempo pra viver mais tarde ao lado de quem eu amei sem saber, uma dor que nao tem porque, e vem de lugar nenhum, infinitas pequenas agulhadas que foram se juntando somaticamente despercebidas no fundo da alma ate virarem magoas, Ah, se as magoas passassem assim como o tempo...

zaterdag 26 april 2014

Boa ideia

Ontem dizem que fiz 51 anos! Aqui em casa pela primeira vez ninguem se lembrou de me dar os parabens, na correria de seus quotidianos adolescentes se esqueceram de mim. Confesso que fiquei melancolico, mas sempre fico melancolico em todos aniversarios, no natal, pascoa, quaisquer festas. Sou meio ermitao, eu e meu violao, nos arranhando mutuamente desde os tempos de minha propria infancia em Presidente Prudente. Hoje e dia do rei na Holanda e em todos os cantos do pais as alegorias alaranjadas tomam conta das ruas. Eu tambem acabei por tabela virando meio holandes, mas confesso que gostava mais do dia da rainha, que comemoravam em abril no dia do aniversario da mae dela, alias mais uma dessas coisas estranhas que nunca entendi muito bem. Mas nao precisa entender, apenas vestir algo alaranjado e sair comemorando as cegas sem pensar no assunto. O meu problema e que sempre vivo cogitando bobagens corriqueiras, o porque disso, o porque daquilo, coisas sem importancia alguma e que parece que ninguem ao meu redor se da conta de pensar. As vezes fico meio triste e escrevo uma poesia. Outras alegre e lembro de algum causo engracado de minha juventude. Nesta manha nao e um nem outro, apenas este vazio solitario do meu esquecimento aniversarial de ontem, e o do rei da Holanda lembrado poe milhoes e comemorado ao vivo pela tv. Eu queria gritar, po, olha o rei esta peladao, mas parece que ninguem ouve a gente numa hora dessas. Aqui o meu vilarejo ja esta comecando a pegar fogo. Se me der coragem acho que vou de bicicleta tomar um sorvete na barraquinha do meu amigo Andrys, com minha zorba alaranjada debaixo do jeans apertado na cintura e na bunda pelos quilos desnecessariamente acumulados neste 51 anos de solidao...

dinsdag 15 april 2014

Tempestades do amar

Acho que a gente nem sabia que tudo passa, passaria, nas asas gigantes daquele e deste tempo, da poesia, enfim fomos nos separando pouco a pouco, a cada dia, ambos navegando felizes em nossos mares diferentes, a vida repleta de tempestades, nossos corpos, cataventos, girando mas querendo parar, sonhando e querendo acordar, todavia desde o inicio amando e querendo apenas amar...

dinsdag 25 maart 2014

Versos tatuados

Se eu me escrever em versos, Quem sabe voce vai me ler, Quero consertar meus erros, Um dia talvez me entender, Poder parar indo em frente, Ser igual e assim diferente, No fundo do peito da gente, Essa tristeza esse ausente, De quem ficara de repente, Em exilio num continente, Ouvindo mil cancoes tatuadas, Num velho coracao dormente...